A
Umbanda é uma religião brasileira, cujas raízes históricas antecedem ao marco do
mito fundador construído em torno de Zélio Fernandino de Morais. De fato, houve
um período de transição no qual começaram a surgir elementos típicos da Umbanda
nos cultos originais de ascendência africana, ameríndia e européia. As
manifestações de espíritos ancestrais por meio da mediunidade de incorporação
marcou a passagem dos cultos de nação para aquilo que viria a se compor como o
movimento umbandista. Com o surgimento de espíritos de caboclos, pretos-velhos,
exus e outros, modificaram-se os valores originais daquelas culturas ao mesmo
tempo que se aproximaram as tradições por meio do sincretismo. O resultado foi a
constituição de um sistema de crenças brasileiro de caráter peculiar, tanto em
termos de práticas litúrgicas como da metafísica ou cosmologia. Uma das
singularidades da Umbanda se encontra na forma de enxergar as hierarquias
divinas.
De
modo geral, há duas formas de espiritualidade: a teista e a não-teista. Embora
alguns advoguem o respeito às diferenças alegando que "todas religiões são boas
porque acreditam no mesmo Deus", a verdade é que existem grupos não-teistas como
os budistas(portanto, sem um deus) e grupos que são essencialmente politeistas
ou panteistas e que merecem o mesmo respeito que as religiões de origem
abrâmica. Além disso, existem escolas ou seitas dentro das grandes religiões que
adotam posturas diferentes no que diz respeito às divindades.
Com
o risco de pecar por excesso de generalização, podemos dizer que do cristianismo
recebemos uma herança eminentemente monoteísta, dos africanos somos tributários
de um caráter politeista e dos indígenas adquirimos uma visão da natureza que
pode ser associada a um panteismo.
O
monoteismo significa a crença em um único Deus, de caráter supremo e onisciente.
Das religiões abrâmicas encontramos no islamismo o melhor exemplo de monoteismo,
já que não há adoração a ninguém mais a não ser para Allah. O cristianismo parte
já de uma visão plural da divindade, no sentido de que temos o Deus-Filho e o
Espírito Santo ao lado de Deus-Pai, constituindo o mistério da Santíssima
Trindade. Particularmente, o catolicismo apóstólico romano atribui a espíritos
humanos desencarnados uma posição especial com poderes espirituais específicos e
uma adoração na forma da plêiade de santos tão próximos das culturas populares.
Tais práticas foram descartadas pelas igrejas protestantes.
Os
cultos de nação africanos, sejam de origem iorubá quanto banta, expressam um
conjunto de deuses criadores e sustentadores da natureza que são denominados
Orixás, Voduns ou Inquices, de acordo com a tradição. Alguns entendem que tais
cultos sejam verdadeiramente politeistas, enquanto muitos adeptos das religiões
africanas afirmam serem monoteistas pelo fato de existir um deus supremo ou
melhor dizendo, um deus criador, chamado Olodumare, Olorun ou Zamby Apongy.
Todavia, a categoria que melhor expressa a prática dos cultos africanos é a de
religiões "henoteistas". Nesse grupo estão as religiões que admitem a existência
de várias divindades mas que adotam uma única como objeto de devoção. Essa era
justamente a forma como se reverenciava os Orixas nas cidades-estados africanas.
Como exemplo, citamos o culto a Xangô em Oyó, o culto a Oxossi em Ketu ou o
culto a Yemanjá em Abeokutá.
Dentre
as várias teogonias e cosmogonias das nações indígenas brasileiras, tanto do
Tronco Tupy quanto do Macro-Jê, veremos muitas maneiras de contato com o Sagrado
e chama a atenção a presença dos encantados que revela uma tendência panteista
na assimilação dos seres naturais, humanos ou animais, pelo universo do
Sagrado.
No
surgimento da Umbanda encontramos a fusão harmônica dessas múltiplas
perspectivas. O aparecimento de entidades espirituais como mediadoras desse
encontro de culturas foi instrumental no processo do sincretismo e favoreceu uma
transição no tempo e no espaços para as várias formas de acepção da divinidade.
Embora como resultante constatemos que a Umbanda reconhece o Sagrado desde sua
origem imanifesta até sua concretização mais palpável na natureza e ainda
desvele o caráter sagrado do próprio ser humano, fomos por esse motivo mesmo
vítimas de preconceito e segregação. O etnocentrismo próprio das culturas
dominantes impôs sobre todas as culturas que não eram monoteistas os rótulos de
"religiões primitivas" e de "culturas atrasadas".
Atualmente
vemos novamente a Umbanda reavivando as discussões acerca do Sagrado e uma
importante síntese foi proposta por F. Rivas Neto, fundador da FTU - Faculdade
de Teologia Umbandista, com o título de "A Vertente Una do Sagrado".
De
acordo com o ilustre sacerdote umbandista, existiria uma estrutura básica para a
teogonia da maioria das religiões que demonstram uma funcionalidade como abaixo
descrita:
1.
Divindade Suprema ou Realidade Última.
2.
Potestades Divinas (inclui os Orixás, os Arcanjos e demais seres
primordiais).
3.
Ancestrais Ilustres (seres humanos divinizados).
4.
Humanidade.
5.
Natureza
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