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quarta-feira, 7 de abril de 2010

RAÍZES DAS VICIAÇÕES

Quando abordamos o problema da viciação, não podemos cair em lugares comuns de condenação, mas precisamos tentar compreender porque o Espírito se vicia. O termo "vício" é abrangente. Naturalmente há uma conceituação, um consenso social de vício que se caracteriza pela expressão exterior de atitudes e comportamentos que apresentam sinais de degenerescência do indivíduo em si mesmo e no grupo. Algumas vezes certos vícios são catalogados nos Códigos Penais e sujeitos às consequências da lei. A questão, todavia, sob o ponto-de-vista espírita é mais ampla. Segundo O Livro dos Espíritos, dentre os vícios, o mais radical é o egoísmo. O assunto é tratado nas questões 913 e seguintes dessa obra. Aparentemente estaríamos nos afastando de uma análise concreta do problema ao apelarmos para o egoísmo, como raiz de toda a viciação. Entretanto, dá-se exatamente o contrário. Até agora, os problemas das viciações mais evidentes, como o alcoolismo, o tabagismo, o uso de drogas, têm sido tratados de maneira superficial, remontando apenas aos efeitos. Outras viciações não menos funestas, tais como as que distorcem a sexualidade, aprisionam o indivíduo a atitudes mentais de intemperança, descontroles e inibições, reduzindo seu nível de vivência, são catalogadas como doenças de etiologia desconhecida. Na verdade, o egoísmo tem a ver com todas essas anomalias, com essas expressões de comportamento, que denotam toda uma filosofia de vida, toda uma estruturação existencial. Por isso, centralizaremos a abordagem da questão dos vícios no egoísmo. Examinemos as colocações de Allan Kardec e dos Espíritos que colaboraram com ele na Codificação. Na questão 913, de O Livro dos Espíritos encontramos indicações bastante definidas a esse respeito. Por exemplo: "Estudai todos os vícios e vereis que no fundo de todos há egoísmo. Por mais que lhes deis combate, não chegareis a extirpá-los, enquanto não atacardes o mal pela raiz, enquanto não lhes houverdes destruído a causa. (Nestas e nas demais citações estaremos usando a tradução de Guillon Ribeiro, editada pela FEB). Kardec nas questões 914 e 915, coloca o egoísmo em duas condições, relativamente ao Espírito: 1°) o egoísmo fundamenta-se no sentimento de interesse pessoal e 2°) o egoismo é inerente à espécie humana. Por isso ele questiona sobre a possibilidade do egoísmo ser extirpado do coração do homem e de se tornar um obstáculo ao reinado do bem absoluto na Terra. A resposta a essas preocupações do Codificador, imediatamente às duas citadas questões e nas seguintes, fornecem-nos toda uma filosofia de vida e uma diretriz de como a Humanidade se libertará desse obstáculo. Fundamentalmente os Espíritos que colaboraram na Codificação, atribuem à educação o papel decisivo no combate ao egoísmo. Isto é, na instrução do homem acerca das coisas espirituais e na reforma das instituições humanas que entretém e excitam o egoísmo. No desenvolvimento desse processo, "os Espíritos se despojam do egoísmo, como de suas impurezas" e isso levará a uma nova ordem social "impelidos pelo sentimento mútuo de solidariedade. Então, o forte será o amparo e não o opressor do fraco e não mais serão vistos homens a quem falte o indispensável, porque todos praticarão a lei de justiça. Esse o reinado do bem, que os Espíritos estão incumbidos de preparar". Essa colocação diz bem dos objetivos do espiritismo e mostra a relação indivíduo-meio, na raiz dos vícios, porque o egoísmo é tanto um defeito, uma impureza individual, como coletiva. E mostra como, desde a Codificação, o espiritismo compreendeu esse relacionamento e essa influência recíproca. No processo educativo a que se reierem os Espíritos, o espiritismo terá grande influência, porque, segundo comunicação do Espírito Fénelon (questão 917): "Quando bem compreendido, se houver identificado com os costumes e as crenças, o Espiritismo transformará os hábitos, os usos, as relações sociais. O egoísmo assenta na importância da personalidade. Ora, o espiritismo, bem compreendido, repito, mostra as coisas de tão alto que o sentimento da personalidade desaparece, de certo modo, diante da imensidade. Destruindo essa importância, ou, pelo menos, reduzindo-a às suas legítimas proporções, ele necessariamente combate o egoísmo". Por fim, da lúcida apreciação que Kardec faz, após a questão 917, convém ressaltar as seguintes palavras: "O homem deseja ser feliz e natural é o sentimento que dá origem a esse desejo. Por isso é que trabalha incessantemente para melhorar sua posição na Terra, que pesquisa as causas de seus males, para remediá-los. Quando compreender bem que no egoísmo reside uma dessas causas, a que gera o orgulho, a ambição, a cupidez, a inveja, o ódio, o ciúme, que a cada momento o magoam, a que perturba todas as relações sociais, provoca as dissenções, aniquila a confiança, a que o obriga a se manter constantemente na defensiva contra seu vizinho, enfim a que do amigo faz inimigo, ele compreenderá também que esse vício é incompatível com sua felicidade e, podemos mesmo acrescentar, com a sua própria segurança". Esse posicionamento do espiritismo no seu livro básico, por si mesmo é de tal forma abrangente que nos levaria a terminar por aqui as considerações sobre o problema do vício, não fora a necessidade de aplicá-lo de maneira objetiva ao comportamento humano. De fato, muito poderiam perguntar que relação tem o egoísmo com o problema existencial do jovem que se deixa vencer pela droga, pelo alcoólatra jogado à sarjeta e pelo fumante que traga seu cigarro? Ou como interar o egoísmo, o instinto sexual com o vício do jogo? O egoísmo é uma chaga que corroe o Espírito e a sociedade. Ele leva o indivíduo aos problemas emocionais, às perturbações espirituais, à insegurança existencial, que aí estão na base dos comportamentos viciosos. E graças ao egoísmo social, travestido na organização política e econômica, que oprime o indivíduo, que marginaliza a criatura, em favor do conceito de poder e de produtividade, que se geram as diversas formas de delinquência e se produz o auto flagelo físico e moral, em que muitos caem inapelavelmente. Esse egoísmo comercializa a droga, a distribui entre crianças e jovens. Doura a pílula amarga do cigarro, pela fantasia da propaganda, forçando a imitação pelos mais fracos. Torna elegante e parte integrante da alegria e da dor, o consumo de bebidas de alto teor alcoólico. Monta cassinos, cria loterias, o jogo do bicho, o carteado. É também esse egoísmo que agencia a prostituição, divulga o frenesi da paixão sexual, que advoga a libertinagem. Enfim, que procura cada fraqueza, cada desvão, para institucionalizar o vício, pouco importando que o Espírito se esfarrape e se destrua. O egoísmo é tão solerte que criou o machismo, o vencedor, como sinônimo de dominador, mesmo à custa de suas energias mais caras. Avançou sobre a mulher, atacando-a e estimulando-a a crer que somente pela adoção de certos vícios é que se realizaria socialmente. Não se pense que essas considerações eximam o indivíduo de sua responsabilidade. Já vimos que a interação do indivíduo e o meio é de tal ordem, que não se pode, a não ser idealmente, fazer uma separação, uma divisão definida. Por isso, qualquer modificação substancial das viciações tem que ser simultaneamente tentada nos campos individual e social. O egoísmo se exprime em atos de agressão contra os outros, mas também de agressão contra si mesmo. Não seria inoportuno afirmar aqui que para deixar de ser egoísta é preciso aprender a amar. E amar é doar-se. Ora, o egoísmo nos sugere que qualquer doação é uma perda, porque supõe que a segurança, a felicidade está em reter, em possuir, em dominar. Daí ser o exercício da transição do egoísmo para o altruísmo uma atitude que depende da educação que abra ao homem as perspectivas amplas da Vida imperecível e dinâmica. As viciações de toda a sorte podem ter uma causa imediata diferenciada, devido aos estímulos que cada um agasalhou, mas refletem, em última instância, o egoísmo. O que "viaja" nas asas da droga, procura um mundo isolado, uma solidão de prazer, onde possa fugir de si mesmo e dos outros. Mesmo o prazer aparentemente inocente do cigarro reflete esse edonismo exclusivista, uma introjeção de imagens e sentimentos, uma barreira de isolamento. O mesmo, em maior grau, quando comparado ao cigarro, se refere ao alcoolismo. Os vícios sexuais, tanto quanto a violência, a revolta, são outras tantas manifestações de doença egoísta, porque o sexo, neste caso, é uma tentativa de prazer com sofrimento do outro, uma agressão a si mesmo e ao parceiro, um escárnio às forças criativas, que pedem doação. A violência e a revolta exprimem uma força ainda mais aguda de egoísmo. Mas, como todo egoísmo, a grande vítima, afinal, será sempre o egoísta, que sofrerá a solidão afetiva, a desarticulação dos centros da sensibilidade e os desequilíbrios quê se exprimem pelas formas de loucura. Embora esteja definitivamente comprovado o efeito nocivo do fumo para as vias respiratórias e na estimulação cancerígena, ainda que informados, milhões continuam a fumar. O tabagismo é um vício social, estimulado por uma propaganda contínua e representa poderoso volume de investimentos e captação de impostos. Para muitos, constituiu-se num vício, num comportamento compulsivo, insuperável. O alcoolismo é dos mais terríveis flagelos sociais, embora a produção e o consumo de bebidas não sofra qualquer restrição. Milhões de indivíduos penetram o escuro corredor do alcoolismo, que degrada, flagela, destrói física e moralmente a pessoa. Inibindo a manifestação da consciência, destruindo os tecidos e as atividades do organismo, o alcoolismo é responsável por lamentável e interminável cadeia de males, a se espraiarem por inúmeras pessoas, relacionadas com o alcoólatra. Há ainda a viciação no jogo, de qualquer natureza. Essa, reflete a imaturidade do indivíduo, em busca de galgar posições, situações, pela sorte. Esse vício é, assim, uma caracterização do egoísmo, na medida em que procura escamotear a fragilidade do indivíduo que procura deter o cetro da vitória ou do poder, passando "por cima dos outros" sem o merecimento da construção concreta da felicidade. Mas, na verdade, o jogador é mero instrumento do egoísmo social, da industrialização secular da cupidez. Joga sua energia, sua fibra, seu tempo, comprometendo o destino. Finalmente, a toxicomania. Nela a estimulação dos centros nervosos, reforçada quimicamente, produz, ao início, sensações de liberação, pelo deslocamento do perispírito artificialmente, levando as almas inseguras ao nirvana da imponderabilidade transitória. Aos poucos, contudo, mental e fisicamente, o indivíduo torna-se irreconhecível. Seus reflexos diminuem. A inteligência turva-se, a sensibilidade torna-se difusa. Os centros perispiríticos desarticulam-se. É como se tornasse uma ameba gigante, monoideizada, que passa a viver vegetativamente. Não é mais um ser independente, é uma extensão de suas próprias fraquezas. Não podemos, evidentemente, simplificar a causa porque as pessoas mergulham no poço das viciações, dizendo "é egoísmo". Sendo este inerente à imperfeição, está na raiz do comportamento anormal, mas as formas como cada um cria esses estados mentais depressivos, essa fixação e envolvimento em atitudes que o desfiguram e lhe retiram a dignidade, são complexas. Não seria possível descer às raízes dos processos de viciação. Como não é nosso propósito discorrer sobre os caminhos difíceis e tortuosos de quem se disponha a reerguer-se, sobrepondo-se à pressão viciosa em que se mergulhou. Contentar-nos-emos em enfatizar que a compreensão espírita e seus princípios vivenciais serão capazes de, primeiramente, colocar-nos diante do apelo dos vícios de forma crítica e, assim, superá-lo, pela expressão de nossa atitude perante a vida. O espírita, em primeiro lugar, sabe que viverá sempre e que a viciação não se circunscreve somente aos centros do organismo físico, mas também dos perispirituais e, mais do que isso, lhe atinge o cerne espiritual. Esse fato determina disfunções psíquicas e físicas que prosseguem, na continuidade da vida, a repercutir na constituição perispirítica e somática em várias encarnações e constituindo-se na raiz de muitas das deformações encontradas na existência terrena. Ele sabe, dentro da globalidade da visão espírita, o que é, porque é e para que é. Compreende que seu corpo físico é um santuário, erguido pela Sabedoria Divina, para servir-lhe de instrumento de crescimento e que a vida é inflexível: devolve, invariavelmente, em respostas adequadas, as agressões que sofre. Está claro que isso por si mesmo não basta para eliminar o problema interior. Mas o indivíduo compreende que não tem mais sentido ou significado, canalizar suas frustrações para comportamentos flageladores e auto-aniquilantes, porque a realidade é persistente, permanente e confortável ou desconfortável, conforme a atitude tomada e vivida. Então, desencantos, desilusões, frustrações, angústias, medo, insegurança e outros sintomas que geralmente estão ligados aos comportamentos viciosos, são assumidos e canalizados para a construção do bem, isto é, o espírita sabe que o envolvimento, a doação, a partilha de sentimentos, constituem remédios eficazes para os descaminhos. Aliás, os únicos caminhos, porque são os que produzem respostas compensatórias. Então, esse aprendizado do "servir" não é mais um exercício de virtude, no sentido salvacionista, mas uma terapia, capaz de devolver o equilíbrio perdido e, sob o ponto-de-vista espírita, mostrar perspectivas realmente confortadoras, sustentáveis para o esforço de superação de si mesmo. É também possível dizer que, sob a luz da filosofia espírita, a vida só é valorizada pela criação e participação no bem, isto é, pela superação do egoísmo, que é a causa mais profunda de todos os estados depressivos, viciados e doentios da alma.

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